Pinturas de Armanda Passos, minha pintora preferida.


terça-feira, 5 de abril de 2011

OS VAPORES DE DESCARTES

Achei curioso na leitura de Descartes, sim esse francês filosofo e matemático que a maioria de nós teve de estudar na Filosofia, que actualmente já estava no fundo da prateleira, no seu famoso Discurso do Método, sobre as Paixões da Alma.
Como médicos, e mesmo aqueles que não os são, achamos evidentemente piada aos considerandos que na altura eram tidos como prováveis ( Sec XVII ). Desse livro retirei dois pequenos trechos que passo a citar:
ART. 128: Da origem das lágrimas
Assim como o riso nunca é causado pelas maiores alegrias, assim as lágrimas nunca provêm duma extrema riqueza, mas somente da que é moderada ou seguida de qualquer sentimento de amor ou alegria. E para bem compreender a sua origem é preciso notar que, embora continuamente saiam muitos vapores de todas as partes do corpo, não há, todavia, nenhuma donde saiam tantos como dos olhos, em virtude da grandeza dos nervos ópticos e do número de pequenas artérias por onde esses vapores a eles chegam; e que , assim como o suor se compõem apenas dos vapores que, saindo das outras partes, se convertem em água à superfície, assim as lágrimas se formam dos vapores que saem dos olhos.
ART. 131: Como se chora de tristeza
…A tristeza é propícia a isso, porque resfriando todo o sangue, contrai os poros dos olhos. Mas como à medida que os contrai, diminui também a quantidade de vapores a que devem dar passagem, isso não basta para produzir lágrimas, se a quantidade desses vapores não for ao mesmo tempo aumentando por qualquer outra causa. E nada a aumenta tanto como o sangue, que é enviado do coração, na paixão do amor. Por isso observamos que os que estão tristes não vertem continuamente lágrimas, mas apenas intervaladamente, quando fazem qualquer nova reflexão sobre os objectos que os emocionam.

ERA UM REDONDO VOCÁBULO

Era um redondo vocábulo
Uma soma agreste.
Revelavam-se ondas
Em maninhos dedos
Polpas seus cabelos
Resíduos de lar
Pelos degraus de Laura
A tinta caía
No móvel vazio
Convocando farpas
Chamando o telefone
Matando baratas
A fúria crescia
Clamando vingança,
Nos degraus de Laura
No quarto das danças
Na rua os meninos
Brincavam e Laura
Na sala de espera
Inda o ar educa.

" TE "

Não sei bem o quê, quem, quando, onde.
Mas
quero...tanto.
Dói de tanto querer, desejar, ter, possuir.
Dor quente,
linda, frenética, intolerável de meiga e
agressiva...
Quero...
Preciso...
Te, a ti, para ti, de ti...para
mim.
Afinal é de ti...
Afinal...quero-te.
Poder-me-ei permitir a tal
veleidade?
Poder-me-ei ofertar com tal prémio?
Poder-me-ei ofertar...a
ti? Querer-me-ás? Merecer-me-ás?
Não quero saber...não me
interessa.
Afinal que diferença faz o quê, o quem, o quando, o onde, se,
apenas...quero.
Quero porque sei que existo.
A ti, porque és a prova da
minha existência. Inexoravelmente.

NÁUFRAGO

No entardecer
Misturam-se as cores do arrebol
Espalhado sobre as águas calmas
De uma casual utopia…


Do sereno
As lágrimas se pranteiam
E fria a lua da noite se apossa
Do véu no céu azulado
E como encanto
Passeia por sobre os mares!

O vento alvoraçando as vagas
Ondula no meu olhar sereno,
Preso na escuridão do mar
Além…
Enquanto a saudade
No meu peito navega:


Eis em mim um náufrago
De ninguém que se apega
A escombros fragmentados de solidão,
Buscando distante
Da imensidão que de mim se afasta,
O brilho do teu olhar
Qual farol piscante ao longe
Que de mim se despede…
E depois se apaga!