Tenente Coelho era o chefe dos revoltosos de Infantaria 10. Um dos revoltosos foi
avisar o Capitão Leitão, que morava próximo, tendo posto de imediato o capacete
na cabeça e de pronto se dirigiu ao local. Estava bem longe de supor que uma
vez chegado ao Campo de S. Ovídio, teria que assumir o comando superior das
forças revoltosas.
No Campo de S. Ovídio os dois regimentos formaram deste
modo: O de Caçadores 9 em quadrado, próximo da porta principal do Quartel de
Infantaria 18; O de Infantaria 10 em dois Círculos na outra extremidade do
Campo.
Uma vez concluída a formatura, soldados e populaça
começaram a dar Vivas à Republica e ao Exercito, com apupos à Monarquia.
Momentos depois o
destacamento de Cavalaria 6, alojado
na dependência do Quartel de Infantaria 18, nesse mesmo Campo, veio em galope
formar na linha paralela à fachada. Ao mesmo tempo convergiam para o Campo as
forças da Guarda Fiscal. As
saudações e os vivas redobraram de intensidade.
Ponto da
Situação: São 4 da manhã de 31 de Janeiro de 1891. Todas estas forças
estavam revolucionadas e só aguardavam a saída de Infantaria 18, para iniciarem a marcha contra o inimigo monárquico. Estes representados dentro do Porto pela Guarda Municipal e pela Polícia Civil.
Com as forças revoltosas especadas no Campo de S. Ovídio
e cercadas por todos os lados pela Guarda Municipal, Infantaria 18 nem andava
nem desandava, pois sargentos e oficiais não chegavam a acordo sobre a atitude
a tomar. Neste regimento, 18 sargentos que tentaram levar duas companhias
através da porta de armas para o Campo, mas as portas voltaria a fechar-se. Os
revoltosos no lado exterior, juntamente com a populaça que cada vez mais
crescia em número, faziam pressão para que o 18 aderisse ao movimento. Pegaram
em machados, e vai daí abriram um rombo na porta do Quartel do lado da Lapa,
preparando-se para entrar. Para evitar carnificina, o Capitão Leitão procurou
convencer o Comandante do 18 , Coronel Lencastre de Menezes, a juntar-se aos
revoltosos, tendo tido a promessa que seguiriam em breve.
Acreditava-se firmemente que este Regimento iria apoiar a
revolta: Se assim fosse a vitória estaria praticamente no papo, pois teria um
alto significado não só para a população civil mas para outros militares e Quartel-General
o facto de estas tropas serem comandadas por um Coronel e muitos Oficiais. As
adesões seriam inumeráveis e ninguém teria dúvidas em aceitar os factos consumados.
Enquanto isto decorria, as forças da Guarda Municipal,
sob o comando do major Graça, retiraram prudentemente daquele local, deixando
livres as ruas para evitar o confronto, e foram estacionar para a Praça da
Batalha, junto ao Quartel-general (onde é hoje o Governo Civil) e do telégrafo.
Os Revoltosos saíram finalmente do Campo de S. Ovídio e dirigiram-se pela rua
do Almada até à Praça de D. Pedro, (actual Praça da Liberdade), onde deveriam
ocupar os Paços do Concelho e efectuar a cerimónia da deposição do Monarca
reinante e da Proclamação da República. “Pelas ruas o povo acenava com lenços,
davam palmas e segundo o cronista, nunca tão espontânea e tão calorosa
manifestação se produziu na bela cidade nortenha. Na rua a multidão engrossava
a cada momento e era difícil romper perante a massa compacta que se
aglomerava.”
Pouco passava das 6 da manhã, quando de repente se
abriram as janelas dos Paços do Concelho e alguns indivíduos da classe civil apareceram
a dar vivas à Republica, ao Exercito e aos Regimentos Sublevados. O Dr Alves da
Veiga faz um discurso e foi anunciado os nomes das pessoas que deveriam
constituir o governo provisório, entre as quais Rodrigues de Freitas, Joaquim
Soares (Desembargador), Joaquim Albuquerque (Lente da Academia Politécnica ),
Santos Reis ( médico ) , e Licínio Leite ( Banqueiro ).
O Capitão Leitão, vendo que em contrário do que lhe
assegurara o coronel Lencastre da Infantaria 18, reconheceu que tinham sido
traídos, uma vez que para além deste havia ainda a esperança que a Guarda
Municipal também iria aderir. Também por via civil, veio a tomar conhecimento
que a Guarda Municipal estava a ocupar posição na Praça da Batalha em plano
defensivo, para proteger o Quartel-General e o telégrafo.
Os revoltosos (Capitão Leitão, Tenente Coelho e Alferes Malheiro)
após confidenciarem, resolverem que o Capitão Leitão iria à frente das forças
pela Rua de S. António ( hoje 31 de Janeiro ), e ao chegar à Praça da Batalha
procuraria parlamentar com o Sub-Chefe do Estado Maior, Fernando de Magalhães,
que os revoltosos consideravam inteligente e pessoa de carácter. Ele iria
decidir em ultima instancia se a superioridade estava na verdade do lado dos
sublevados e se a Guarda Municipal poderia submeter-se-lhes sem hesitações.
Havia esta esperança uma vez que com a certeza quase absoluta que o Regimento
de Infantaria 18 havia aderido, não era razoável nem patriótico que a Guarda
Municipal não o fizesse, uma vez que estava praticamente sozinha nesta
contenda. Assim os revoltosos, não tinham a menor intenção de derramar sangue
de irmãos de armas ainda por cima convencidos que todo o exercito se sentia
impelido a resgatar o País da humilhante situação em que se encontrava, devido
aos governos da monarquia, que não se inspiravam nos sagrados interesses
nacionais.
O Ataque:
“As forças do comando do capitão Leitão
saíram da Praça de D. Pedro e principiaram a subida pela Rua de S António, em
marcha de quatro, levando à frente a
banda de infantaria 10; Seguia-se-lhe a Guarda-fiscal e iam depois Caçadores 9.
A Guarda Municipal formava no alto da rua, no adro escalonado de S Ildefonso,
guardando a entrada na Batalha pelas ruas de S. Catarina, S. António, e de S
Ildefonso. Uma multidão enorme acompanhava as forças da revolta em sua marcha,
e esta artéria do Porto tinha uma aspecto quase d festa. Do povo saiam brados
entusiásticos vitoriando os sublevados. A marcha das forças tinha o carácter insofismável
dum passeio triunfal, em que eles pareciam recolher os aplausos pela vitória
alcançada rapidamente e sem embate sensível. Na altura da viela chamada dos
Banhos, do lado direito da rua de S. António o povo que acompanhava os
sublevados hesitou e recuou. O capitão Leitão olhou para cima e viu o guarda
municipal em atitude defensiva, com as armas apontadas para a coluna. Não ligou
grande importância ao facto e, como a banda de Infantaria 10 continuasse a
tocar, não ouviu que de S. Ildefonso as cornetas tinham feito o sinal de
alto-meia volta. A marcha prosseguia e de repente, saíram da forma dois
soldados da guarda-fiscal, que se dispunham a disparar as armas contra a
municipal, tendo de imediato sido repreendidos pelo Capitão Leitão que lhes
ordenou: - Não atirem!..A guarda não nos faz mal!
Posteriormente colocando-se à frente da coluna, levantou
os braços, como pretendendo afirmar à municipal que a atitude dos sublevados
era pacífica. A guarda, fazendo pontarias baixas, deu uma descarga que lançou o
maior pânico nas forças da revolta e nos populares que pejavam a rua de S. António.
A marcha deteve-se, e num segundo produziu-se um precipitado movimento de
recuo, e a coluna dissolveu-se, desordenada e a breve trecho a Rua de S. António
ficou juncada de corpos inanimados e com despojos das vítimas. O capitão Leitão
foi ferido na cabeça mas conseguiu escapar e conseguiu chegar até à Praça Nova.
A Guarda Municipal abrigada por detrás das pedras continuava a disparar. Os
soldados revoltosos, enquanto tiveram munições, iam respondendo com valentia ao
ataque da força fiel ao regime monárquico. Estes valentes eram principalmente
da guarda-fiscal e caçadores 9, pois infantaria 10 que estava no fundo da rua
de S. António, ao começar o tiroteio fora forçada a recuar até à Câmara. Não
mais se conseguiram organizar pois da Serra do Pilar, e outras baterias
postadas nos ângulos de S. Bento e dos Loyos começaram a atacar os sublevados
que ficaram encurralados nos Paços do Concelho. Um tiro de peça, arrombando a
porta do edifício, mostrou aqueles valentes que a situação se definia irremediavelmente
como a derrota da Republica. O capitão Leitão abandonou a casa da Câmara e
pouco depois os outros combatentes imitaram-no, terminando a luta por volta das
9 da manhã.”
Oficialmente foram 12 as vitimas do movimento
republicano, mas segundo a imprensa e estudo dos despojos abandonados e entrada
de cadáveres nos Hospitais (Terço e Misericordia ) e os recolhidos das ruas,
pensa-se que o numero efectivo rondaria os 50. O túmulo das vítimas “ Paz Aos
Vencidos “ encontra-se no Cemitério do Repouso.
Terminados os julgamentos algum tempo depois em Conselho
de Guerra, foram condenados s prisão maior celular ( e, na alternativa, na de
degredo), João Chagas, Verdial, Capitão Leitão, os sargentos Abílio, Galho,
Silva Nunes e outros. O tenente Coelho foi condenado a 5 anos de degredo. Os
Regimentos de Caçadores 9 e Infantaria 10 também sofreram castigo exemplar: O
Governo dissolveu-os.
Reparem os leitores, principalmente os mais velhos, as
semelhanças com o que aconteceu 83 anos depois com a Revolução do 25 de Abril.
Com a diferença que nesta ultima não houve qualquer resposta da Guarda
Republicana que respeitou o povo em simbiose com o militares, não havendo
derramamento de sangue. A 31 de Janeiro de 1891, no Porto, não houve cravos mas
lágrimas, e os ideais revolucionários tiveram ainda que esperar alguns anos.
Baseado na Revolução de 31 Janeiro – Jorge Abreu , Ed
Casa Alfredo David - 1912
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